terça-feira, 25 de maio de 2010

Sanidade insana

Estou louco!
Acordei de ponta cabeça, com os pés descalços e as mãos cruzadas dentro do bolso. Abri um olho e depois o outro, e cocei a cabeça sem ter medo de que me apontassem e julgassem o que eu já sabia: estou louco.
Então olhei pela janela do nono andar. Era noite e o sol brilhava, que audácia! Lá embaixo eu vi duas crianças sujas e mal vestidas, atravessando a rua sem nenhuma expectativa para olhar pros dois lados. Chegaram no bar já aberto - onde havia um rapaz virando dois, três, quatro copos de água, creio eu - e pediram suplicamente ao balconista por qualquer resto de comida.
Voltei para dentro do meu quarto e fui me olhar no espelho. Estava louco, só podia ser.
Respirei fundo e coloquei em mente que viveria como se fosse um dia normal. Tomei meu banho, vesti minhas roupas, calcei meu tênis e peguei o elevador. Uma moça com um cachorro enorme estavam lá dentro. Tremi, mas dei cordialmente um bom dia sem respostas, apenas um olhar torto. Só podia ser alucinação...
De volta à rua já era noite de novo, e os mesmos garotos - ou não - que suplicaram o veneno da fome se envenenavam nas esquinas da minha rua. Debaixo de um cobertor, um maltratado cobertor, eles fizeram o que me parecia uma fogueira. Apenas um isqueiro e uma base de copinho de leite fermentado. Ou era um jeito muito estranho de se fazer uma fogueira ou estava louco. Segui em frente com a segunda opção.
Estou louco, eu já sei.
Mas o que mais me surpreendeu nos meus momentos de insanidade foi a falta de capacidade dos que estavam a minha volta de amar. Estou louco, eu sei, mas eles preferem esteróides ao cérebro e o silicone ao natural.
Eles não dizem que amam, mas sentem. E eles andam no bolso com uma planilha de contabilidade: quanto maior e mais recheada for, mais honorários simbólicos eles vão ter. E eles olham para cada rosto como se fosse o troféu mais lustrado da prateleira, e eles olham para cada corpo e vêem o reflexo da luxúria que só os agrada.
Que loucura pensar que o romance já existiu, talvez eu tenha sonhado na noite anterior em que fiquei louco. Mas eu também li no jornal que o plástico está acabando com o mundo, e vi também na revista umas atrizes que comprovoram a matéria, o que me deixou na dúvida se era eu o louco ou era eu o pirado.
Entrei na neura de que talvez eu também fosse assim, então logo olhei para a moradora de rua no ponto de ônibus com ternura nos olhos. Até pensei em beijá-la, mas talvez aí sim estaria comprovando a minha loucura. E se eu só sonhei que eu acreditava na razão pela emoção e vice-versa?
Preocupei e peguei meu celular, procurei contatos, uma prova lícita e encontrei mensagens. De afeto, de carinho e de amor. De amor! Estava louco então, um louco perante toda a sociedade moderna e comum. Pós moderna e pirada.
Estou louco e é muito difícil um louco interpretar algo, mas mais difícil ainda é interpretar a mente de um louco.

Um comentário:

@ThayG12 disse...

De médico, publicitário e louco... rs. ;)